A pata nada, mas será que brinca?
Mario Sergio Cortella*
Conhecimento não é acúmulo de informação: deixemos nossas crianças se divertirem com o aprendizado
O mundo está mudando. A rapidez das alterações é tão inédita que, por exemplo, o aluno que entrou este ano na primeira série do ensino fundamental, antes mesmo de botar o pezinho para ser alfabetizado por nós na escola, antes de ter contato conosco, educadores e educadoras, já tinha assistido a 5 mil horas de televisão.
Calcula-se que uma criança assista, em média, três horas de TV por dia (mil horas por ano), a partir dos 2 anos de idade. Portanto, dos 2 aos 7 anos, quando ela entra no ensino fundamental, já assistiu Discovery Channel, National Geographic, filme pornográfico, novela, bombardeio dos prédios de Nova York, desenhos animados, enfim, ela já assistiu muita coisa. E é assim que ela chega na escola, senta no primeiro dia de aula e fica esperando. E nós, quantas vezes, começamos a aula dizendo: "A pata nada."
Não se confunda conhecimento com informação. Conhecimento é seletivo, informação é cumulativa. A nossa escola, de maneira geral, nos passou fortemente a idéia de que informação era conhecimento. E não é. Por isso uma das tarefas fundamentais da família e da escola é ajudar as crianças e jovens a desenvolverem critérios de seleção, em vez de soterrá-los com informações.
Velocidade, movimento, correria. As crianças também são induzidas a viverem turbinadas. A cada dia se tem menos tempo, levanta-se mais cedo e vai-se deitar mais tarde. E vai-se deitar com débito, achando que deveria estar acordado ainda, fazendo coisas. A ciência nos prometeu, há cem anos, no início do século XX que, quanto mais tecnologia, mais tempo livre e nós estamos em uma explosão tecnológica, quase sem tempo nenhum.
Hoje há crianças de 7 anos que não têm tempo para nada. Elas têm agenda de executivo - já estão neuróticas. Não podem ficar paradas, brincando: a família tem de preencher o tempo dela com tarefas, a escola também tem de dar tarefas. Tem escola, inclusive, que enche a criança de tarefa na sexta-feira, para trazer na segunda-feira. É um crime contra a infância.
Sabe o que faz o aluno? Passa o final de semana preocupado com aquilo, não faz, vai fazer somente no domingo à noite depois que está cansado, quase dormindo em cima do caderno e vai criar raiva em relação ao nosso trabalho. Nós dizemos assim: "Ah, mas é preciso." É preciso ou será que é questão de planejamento? Nenhum de nós, professor ou professora, gosta de levar trabalho para casa, por que o aluno gostaria? Nós temos de levar trabalho para corrigir, planejamento, mas se pudéssemos, não levaríamos.
Quem confunde os conceitos, sufoca os alunos com informação, achando que eles precisam saber tudo o que está programado e, como nunca dá tempo de cumprir o programa, eles, discentes não sentem prazer com aquilo que fazem e ficam o tempo todo atarefados com tantas lições. E a família até acha que isso é um sinal de escola boa. Existe algum erro de planejamento da escola ou da família quando a criança não tem tempo para brincar. Criança tem de brincar. É assim que também se aprende. A pata brinca, além de nadar.
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